Por trás da “Justiça perfeita para meus semelhantes e imperfeita para os dessemelhantes”, esconde-se obumbrado um ditador que deseja emergir.
Como os golfinhos, muitos daqueles que defendem a igualdade para todos e a justiça perfeita, seus discursos num primeiro momento parecem fofinhos, inteligentes e amigáveis, mas nas sombras daqueles que não aceitam esse discurso espreita um ditador tão ou mais feroz quanto a docilidade dos seus discursos.
São aqueles que dizem defender uma justiça perfeita para os injustiçados pobres, os mesmos que apoiam a justiça imperfeita, inquisitória, aberta de ofício, sem qualquer respaldo legal, a qual se fosse em qualquer outro país sério, compromissado realmente com a lei, essa justiça imperfeita levaria seus autores para as grades.
O duplipensar desses indivíduos, segundo o livro 1954 de George Orwell, sempre traz consigo essências autoritárias e ditatoriais, cristalizadas no inconsciente, mas com desejo latente de oprimir quem não se adequa aos seus anseios. Isso é evidente quando um pobre ou um negro, ou os dois ao mesmo tempo não se adequam à percepção de mundo desses indivíduos, a bola da vez “Jojo Todinho”.
Kant traz uma observação clara sobre esse duplipensar “A naturalidade para o mal e a disposição para o bem”. Certamente que a escolha do indivíduo nas devidas proporções da sua razão, optaria pela justiça perfeita em todos os casos. No entanto, a ideologia cristalizada com raízes profundas no inconsciente torna-o incapacitado para fazer a escolha correta, ele até poderia se dispor a pensar pelo bem, mas dispor ao bem requer um esforço que seu desejo incrustrado não está disposto a ceder. Por isso sempre é mais fácil pender para o mal.
O indivíduo, que luta pela igualdade e pela justiça perfeita e imperfeita ao mesmo tempo de forma relativa aos réus, isto é, dependendo qual lado estão, tem um certo desejo sádico, prazer e satisfação no sofrimento alheio. Então ele pede justiça para os réus, não porque deseja ver a justiça feita de fato, mas porque seu desejo recai no sofrimento que essa injustiça pode causar.
Certamente que punir com dor e sofrimento a quem somente pensa diferente, colocá-lo-ia no hall dos psicopatas, é tudo quanto quem diz defender os mais injustiçados não quer. Mas eis que surge uma válvula de escape, os inquéritos ilegais, assim como Stalin, que em estados de exceção, a qual vivemos, puni especialmente cristãos através de inquéritos sem qualquer embasamento jurídico.
O sofrimento e dor alheia causa-lhe prazer e satisfação porque ele decidiu ignorar o caminho percorrido para chegar as condenações dos “réus”. Ele sabe que o meio para chegar ao objetivo foi deturpado, mas não consegue livrar-se dos sentimentos e emoções que lhe estão agarrados à sua percepção de mundo.
Sendo assim, por este motivo, ninguém consegue esconder o ditador que existe dentro de si, a não ser que ele não exista de fato. Uma hora ou outra emerge à luz das opiniões, ainda mais quando em tempos de polarização em que argumentos contraditórios desafiam a realidade por ele construída.
Devem pagar aqueles que erraram, mas de modo algum o pagamento para com a lei e para com a sociedade deve ser alcançada por inquéritos ilegais e à margem da Constituição. Bem como quem pretende alcançar a justiça, ainda que se sinta injustiçado, não deve recorrer aos caminhos espúrios, à margem da lei para satisfazer seus anseios.
Essas condutas e percepções só fomentam a desordem.